Em 1974, o Conselho Internacional da Música declarou que o Dia Mundial da Música seria comemorado no dia 1 de outubro de cada ano. Desde então, a instituição tem desenvolvido vários projetos para promover o acesso à música para todos. A instituição dos “5 Direitos da Música” , o Prémio Internacional de Música, ou o Cofre Global de Música, são só alguns exemplos.
Em Portugal, também existem inúmeras figuras e instituições que procuram preservar o direito global do acesso à música, apoiando músicos e dando acesso a conteúdos e espetáculos musicais aos amantes de música e aos cidadãos em geral.
Partilho convosco neste artigo alguns detalhes sobre estes projetos, assim como algumas sugestões de eventos gratuitos para assistir no Dia Mundial da Música.
A história do Dia Mundial da Música
O Conselho Internacional de Música (IMC- International Music Council)
O International Music Council (IMC), fundado em 1949 pela UNESCO, é a maior rede mundial de organizações e instituições que trabalham no campo da música. O IMC promove o acesso à música para todos e o valor da música na vida de todos os povos.
É através da sua rede de membros que o IMC tem acesso direto a mais de 1.000 organizações, em cerca de 150 países e a 600 milhões de pessoas que participam no desenvolvimento e partilha de conhecimento e experiência em diversos aspectos da vida musical.
Desde a sua criação em 1949, o IMC estabeleceu como principal missão materializar a visão de que, a música, tem o poder de unir comunidades e promover a paz mundial.
Foi com este objetivo que o IMC decidiu dedicar um dia do ano à música. O objetivo era o de aproveitar o poder da música para unir comunidades, culturas e inspirá-las a coexistir harmoniosamente.
Lord Yehudi Menuhin
O IMC, especialmente com o seu presidente em 1975, Lord Yehudi Menuhin, um violinista e maestro americano de renome internacional, que acreditava que a música podia fortalecer os relacionamentos e preencher lacunas culturais entre as comunidades, escreveu uma carta aos membros do IMC proclamando o dia 1 de outubro como o Dia Internacional da Música.
Na carta, Menuhin explicou claramente as razões para marcar o dia. O Dia Internacional da Música tem como objetivo:
- Incentivar a arte musical entre todos os segmentos da sociedade;
- Motivar a aplicação dos ideais de paz e amizade da UNESCO entre as pessoas;
- Criar espaço para a evolução das culturas através da troca de experiências;
- Incentivar a valorização mútua das culturas, especialmente seus valores e património estético.
Desde o primeiro Dia Mundial da Música, dia 1 de outubro de 1975, mais de 150 países em todo o mundo celebram o poder da música para unir sociedades, comunidades e pessoas. O dia oferece às pessoas uma ocasião para celebrar a música e contribuir para uma sociedade mais pacífica, alegre e harmoniosa.
Os Cinco Direitos da Música
O IMC, ao defender o acesso à música para todos, proclamou e trabalha para o estabelecimento de cinco direitos da música:
- o direito de todas as crianças e adultos a expressarem-se com toda a liberdade;
- o direito de todas as crianças e adultos a aprenderem linguagens e habilidades musicais;
- o direito de todas as crianças e adultos a terem acesso e envolvimento com a música, através da participação, audição, criação e informação;
- o direito de todos os artistas musicais a desenvolverem a sua arte e a comunicarem através de todos os meios de comunicação, com instalações adequadas à sua disposição;
- o direito de todos os artistas musicais obterem o reconhecimento justo e remuneração justa pelo seu trabalho.
Prémio Internacional de Música IMC-UNESCO
Entre os anos de 1975 a 2005, o IMC concedeu um prestigioso Prémio Internacional de Música, sendo este prémio atribuído a partir de 1978 em cooperação com a UNESCO.
O Prémio foi atribuído a músicos ou instituições musicais cuja atividade tenha contribuído para o enriquecimento e desenvolvimento da música.
O Prémio considerava as seguintes 5 categorias:
- Composição: concedido aos compositores pela sua produção criativa geral;
- Performance: atribuído a indivíduos e agrupamentos no domínio da música popular, tradicional, "clássica" ou do jazz, pela sua atividade geral de concerto;
- Musicologia/jornalismo musical: concedido a musicólogos e críticos de música pelo trabalho produzido com pesquisas ou críticas;
- Pedagogia musical: concedido a membros da profissão docente pelo seu contributo para a educação musical.
O prémio podia também ser atribuído a personalidades públicas, que tivessem desempenhado um papel importante a nível local ou internacional, em mais do que uma área da música, e também a instituições musicais pelas suas atividades ao serviço da música.
Durante a existência do prémio, houve três galardões que foram atribuídos a cidadãos ou instituições portuguesas:
1981 - Fundação Calouste Gulbenkian - Instituição
1999 - Emmanuel Nunes - Compositor
2002 - Maria João Pires - Pianista
Com a mudança na política da UNESCO em relação a prémios, os Conselhos Executivos do IMC e da UNESCO decidiram descontinuar o prémio na forma utilizada até então, desenvolvendo outras alternativas para reconhecer os contributos dos indivíduos e das instituições.
Em 2005 foi atribuído o último Prémio Internacional de Música IMC UNESCO ao compositor grego Mikis Theodorakis.
Desde 2009, a instituição criou o IMC Music Rights Awards, prémio que é concedido a programas ou projetos que apoiam de forma exemplar um ou mais dos Cinco Direitos da Música enunciados pelo Conselho.
Projeto ARV - O cofre global de música
Com o objetivo de cumprir com a sua missão, o IMC é também um parceiro fundador do Global Music Vault, através do Projeto ARV.
Com a importância que a música tem na forma como molda sociedade, inspira e une as várias culturas no mundo, é um património que faz parte do DNA da humanidade e que corre o risco de se perder para sempre, se não for preservada de forma ativa e segura.
O Projeto ARV tem como objetivo ajudar na criação de um cofre global de música, que permita guardar as diversas expressões musicais de todos os países e regiões do mundo.
Através deste projeto, o Global Music Vault vai oferecer cápsulas para armazenar a música viva mais preciosa e amada do mundo, salvaguardando-a o futuro.
O IMC fará a coordenação da recolha das várias contribuições, de todas as regiões e países do mundo, garantindo que nada seja deixado para trás.
Estas cápsulas de música de todo o mundo serão então depositadas durante um evento de depósito inaugural em Svalbard, na Noruega, para celebrar a longevidade da música e garantir que a música seja mantida relevante para as gerações futuras de amantes de música.
O Global Music Vault está situado nas profundezas de uma montanha ártica no extremo norte da Noruega, no arquipélago de Svalbard. Svalbard é uma zona desmilitarizada, declarada por 42 nações.
A segurança, a proteção e o afastamento, fizeram deste local uma escolha perfeita para um cofre contendo informações tão valiosas. Além disso, as condições frescas e secas do pergelissolo aumentam a longevidade dos dados armazenados.
Aqui os arquivos de música mestre e o material musical insubstituível serão preservados por mais de 1000 anos.
É também nesta mesma montanha que está instalado o Global Seed Vault (Dooms Day Vault) que armazena exemplares de sementes existentes em todo o mundo, garantindo a segurança do fornecimento mundial de alimentos contra a potencial perda de sementes em bancos de genes devido a má gestão, acidentes, falhas de equipamentos, cortes de financiamento, guerra, sabotagem, doenças e desastres naturais.
A tecnologia usada para armazenar os dados é tão importante quanto a própria música. A maioria dos meios de armazenamento digital tem uma vida útil limitada, e os formatos de hardware, software e arquivo tornam-se obsoletos à medida que a tecnologia evolui.
A solução que está a ser desenvolvida para armazenar a música no cofre baseia-se em placas de vidro de sílica, que pode resistir às condições ambientais mais desafiadoras e que pode durar mais de 1000 anos no cofre com acessibilidade futura garantida.
E em Portugal?
Em Portugal existem muitas instituições que se dedicam a manter viva a chama do amor pela música, em particular as instituições de formação como, por exemplo, a Escola Artística de Música do Conservatório Nacional, a Academia dos Amadores de Música, já para não falar em todas as orquestras, bandas e coros que existem por todo o país, espaços que promovem a aprendizagem e desenvolvimento para muitos músicos amadores e proporcionam às populações fora dos grandes centros urbanos, a possibilidade de terem acesso a espetáculos musicais, muitas vezes de forma gratuita.
Existem no entanto três instituições em Portugal que quero destacar.
Museu Nacional da Música - em digressão permanente
O Museu Nacional da Música tem uma das mais ricas coleções de instrumentos da Europa, sendo 13 deles classificados como tesouros nacionais, como é o caso violoncelo Stradivarius Chevillard-Rei de Portugal, que pertenceu ao rei Luís I, do cravo Antunes, e do cravo de Pascal Taskin, que têm atraído músicos de todo o mundo para os tocar. Além dos instrumentos fazem parte da coleção vários espólios documentais e um vasto acervo fonográfico e iconográfico.
O Museu tem como missão conservar, estudar, valorizar e divulgar os seus bens culturais, promovendo o património musicológico, fonográfico e organológico português, tendo em vista o incentivo à qualificação e divulgação da cultura musical portuguesa.
A história do Museu Nacional da Música é uma história de inúmeras personalidades que, ao longo dos anos, foram reunindo coleções, estudando-as, procurando espaço adequado para as armazenar, sempre com o objetivo de as tornar visíveis ao público em geral.
A génese do museu remonta a 1911, quando o musicólogo Michel'angelo Lambertini consegue fazer-se nomear pelo governo para iniciar a recolha de instrumentos musicais, partituras e peças de iconografia musical dispersos em edifícios públicos e religiosos.
O objetivo de Lambertini era a de criar um museu, mas confrontado com a falta de vontade da classe governante, começa reequacionar o projeto do museu, procurando a ajuda de particulares.
Recorre então a António Carvalho Monteiro, também colecionador, para que adquirisse a colecção Keil, em perigo de sair para o estrangeiro. Vende-lhe a sua própria colecção e propõe-lhe avançar com o projeto em conjunto.
Carvalho Monteiro aceita e cede um espaço para o efeito num edifício da Rua do Alecrim, onde se reúnem as colecções de Lambertini, Alfredo Keil e Carvalho Monteiro. A recolha continuaria até à morte de ambos, em 1920, altura em que a coleção contava já com mais de 500 peças.
Com as mortes de Carvalho Monteiro e de Lambertini, o projeto de criação do museu instrumental fica adiado.
Como consequência, o acervo reunido na Rua do Alecrim permanece em completo abandono até que, em 1931, Tomás Borba, conservador do então Museu e Biblioteca do Conservatório Nacional, o redescobre.
É Tomás Borba que faz a aquisição do espólio que restava aos herdeiros de Carvalho Monteiro, juntando a este espólio os instrumentos que haviam pertencido ao rei D. Luís, e que se encontravam no Palácio da Ajuda, sendo toda a coleção transferida para o Conservatório Nacional.
Em 1946, com a reabertura do Conservatório após obras de melhoramento, o museu é inaugurado oficialmente, conhecendo um período de desenvolvimento da vertente museológica e da preocupação com o acesso por parte do público.
No início da década de 70, o espaço ocupado pelo museu torna-se necessário, em virtude da criação de três novas escolas no Conservatório - Dança, Cinema e Educação pela Arte.
Tendo em vista a possibilidade de possuir um espaço próprio, as 658 peças, que então constituíam a colecção, são transferidas, em 1971, para o Palácio Pimenta no Campo Grande. Ali permanecem até 1975, em condições precárias.
Nesse ano, por decisão de João de Freitas Branco, então Secretário de Estado da Cultura, e da Escola de Música do Conservatório, são novamente transferidas, desta vez para a Biblioteca Nacional.
Durante este período, comissões criadas para a instalação do museu discutem qual o melhor local para acolher condignamente o acervo musical que continuava a aumentar, tendo sido apontados vários locais como hipótese, mas nenhuma dessas hipóteses foi avante.
Em 1991, por decisão da Secretaria de Estado da Cultura, e correspondendo à vontade da direção da Biblioteca Nacional, que alegava falta de espaço, as colecções são transferidas, mais uma vez, para o Palácio Nacional de Mafra.
Com a assinatura, a 1 de Outubro de 1993, Dia Mundial da Música, de um protocolo, ao abrigo da lei do mecenato, entre o Instituto Português de Museus (atual Direção Geral do Património Cultural) e o Metropolitano de Lisboa, torna-se por fim realidade o sonho de Lambertini, sendo a coleção transferida para um espaço na estação de metro do Alto dos Moinhos, sendo Museu da Música é inaugurado a 26 de Julho de 1994.
Mas também a instalação do Museu da Música no metro do Alto dos Moinhos, em Lisboa, é provisória. A coleção regressará em definitivo Palácio Nacional Mafra, garantindo a atual diretora do museu que o processo de transferência do museu para Mafra está em fase "bastante avançada".
Casa da Música - Uma residência para a música
A Casa da Música é o primeiro edifício construído em Portugal exclusivamente dedicado à Música. Quando em 1998, as cidades do Porto e de Roterdão são escolhidas como Capitais Europeias da Cultura para 2001.
Oficialmente inaugurado a 15 de Abril de 2005, o edifício, com uma arquitetura arrojada, corporiza a ambição e dimensão internacional do projeto artístico, cultural e social. O edifício foi desenhado pelo arquiteto neerlandês Rem Koolhaas.
A Casa da Música tornou-se uma referência na criação de programas artísticos, sociais e educativos, acolhendo na sua atividade artistas, compositores, maestros, músicos, performers e todos os profissionais necessários para levar a palco a sublime arte da música.
Da mais antiga à mais contemporânea, da mais popular à mais erudita, todas as músicas e respetivo público têm um espaço acolhedor para dar vida às várias manifestações em que a música é rainha e os amantes de música a sua corte.
Fundação Calouste Gulbenkian - Música na Escola
A Fundação Calouste Gulbenkian é também uma instituição incontornável na divulgação da cultura musical em Portugal. Criada em 1956 e instituída em perpetuidade por testamento de Calouste Sarkis Gulbenkian, filantropo de origem Arménia que viveu em Lisboa entre 1942 e 1955, a Fundação tem como propósito fundamental melhorar a qualidade de vida das pessoas através da arte, da beneficência, da ciência e da educação.
Com uma ampla oferta em cada temporada, a Gulbenkian Música tem um programa recheado de concertos sinfónicos, ópera, recitais, cine-concertos e músicas do mundo, protagonizados por alguns dos maiores intérpretes da atualidade, em mais de 120 concertos entre setembro e maio de cada ano.
Uma das atividades mais importantes na divulgação da cultura musical é o projeto Música na Escola. O projeto Música na Escola tem como objetivo a qualificação da experiência musical junto do público escolar do 2º ciclo.
Tendo na apresentação pública da Orquestra Gulbenkian o seu momento mais alto, estão associadas a este projeto diversas ações pedagógicas integradas com o intuito de intensificar a experiência do concerto.
Numa primeira fase, elementos da Orquestra Gulbenkian visitam as escolas, contactando diretamente com cada uma das turmas, privilegiando o diálogo de proximidade entre músicos e público juvenil. Numa segunda fase, têm lugar as oficinas pedagógicas, também nas escolas e em contexto de sala de aula, onde através de exercícios práticos com o objetivo de melhor preparar os jovens para a experiência do concerto.
Por último, os alunos deslocam-se ao Grande Auditório Gulbenkian para assistir a um programa de concerto, onde partilham uma experiência orquestral ao vivo para a qual foram preparados ao longo das fases anteriores.
Em cada período letivo, são envolvidos neste projeto cerca de 1000 jovens, tomando contacto com três diferentes programas de concerto da Orquestra Gulbenkian.
Em resumo
Celebre o Dia Mundial da Música. Mesmo que não seja músico ou toque qualquer tipo de instrumento, tenho a certeza que em vários momentos da sua vida já trauteou uma música enquanto fazia alguma tarefa ou tomava um duche.
Tenho também a certeza que esse impulso foi motivado por alguma emoção, de alegria, de saudade ou de tristeza, mas foi garantidamente a forma de exprimir uma emoção.
Até os mais insensíveis já cantaram, pelo menos uma música de parabéns durante uma festa de aniversário, porque a música tem o poder de unir as pessoas.
Para terminar, partilho algumas citações sobre a música, de figuras famosas da história da humanidade:
"A música dá alma ao universo, asas à mente, voo à imaginação e encanto e alegria à vida."
(Platão - filósofo e matemático grego)
“A vida sem a música é simplesmente um erro, uma tarefa cansativa, um exílio.”
(Friedrich Nietzsche - filósofo, poeta e compositor alemão)
“A música é o tipo de arte mais perfeita: nunca revela o seu último segredo.”
(Oscar Wilde - escritor, poeta e dramaturgo irlandês)
“A música é o verbo do futuro.”
(Vitor Hugo - romancista, poeta e dramaturgo francês)
“Onde há música não pode haver coisa má.”
(Miguel Cervantes - romancista, dramaturgo e poeta castelhano)